terça-feira, novembro 08, 2016

A viagem de meu pai, de Philippe Le Guay ***

Dentro de uma temática já bastante abordada por outras produções cinematográficas, a das dificuldades da velhice, “A viagem de meu pai” (2015) não chega a ser uma obra-prima, mas ainda assim consegue apresentar algumas surpresas positivas capazes de gerar inquietação para o espectador. A maior delas é a forma com que o diretor Philippe Le Guay formata a sua narrativa, que se desenvolve a partir de uma relação com a própria dinâmica do processo gradual de senilidade do protagonista Claude Lherminier (Jean Rochefort). Assim, as noções de tempo e realidade vão se tornando cada vez mais difusas com o avançar da trama, ainda que a encenação evoque um tom naturalista, fazendo com que fatos corriqueiros do cotidiano convivam em uma estranha harmonia com toques oníricos e por vezes delirantes. É mérito também do filme em manter uma atmosfera de sobriedade emocional, em que situações melancólicas e mesmo cruéis não são expostas com obviedades sentimentais, prevalecendo uma certa crueza existencial e se permitindo até em alguns momentos uma dose de ironia. Claude não é retratado de forma simplista como uma mera vítima de sua condição como idoso – os percalços pelos quais ele e sua família passam ganham uma condição de inevitabilidade do destino, sugerindo-se ainda como consequências de atos praticados pelo protagonista quando mais jovem e de seu próprio e inato temperamento orgulhoso. Dentro dessa proposta de Le Guay, a atuação de Rochefort ganha especial ressonância, pois sua interpretação é repleta de notáveis nuances dramáticas e cômicas.

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